domingo, dezembro 14, 2008

Vegetação

O relógio marcava as horas que o deixaram de ser, num tempo indefinido, fantasma de outras eras, concretizadas em calendários, preenchidos de dias em que nada se fez..Queria levantar-me, lutar contra a dormência opiácea que não desmentia o aborrecimento, a angústia, o tédio que se abatia sobre o meu corpo..entre a pele que me vestia daquilo que não queria ser.
Continuava estirada na cama, numa massa amorfa de xailes, cobertores, e outros lanifícios afins, que mais pareciam aprisionar-me, interditando assim o suposto aconchego da chuva que se esbatia contra o vidro opaco da única janela do quarto. As pálpebras pareciam trazer em si o peso de mil anos, quando semicerravam o sonho, e o transformavam em pesadelo. O telemóvel tocava, enquanto me rebolava, mais uma vez, no leito onde vivo as núpcias do resto dos meus dias. Não queria atender. Não queria falar. Dizer palavras ocas de significado, que num acto pleno de egoísmo quero abarcar só para mim.
Tentava enfim sair da cama. Avidamente procurava o comando da tv. Queria estupidificar-me, combater o desassossego promovido pelas interrogações que se vão acumulando no baú, de cada vez que exploro um pouco mais daquilo que me rodeia. Percorri todos os canais. Já eram 14h e continuava acorrentada ao ócio que me corrompe até ao tutano das vísceras, que já não aguentam mais viver neste corpo mundano, profano, insano…Deixemo-nos de prosas poéticas, quando hoje só existem factos. E o facto é que ainda estou na cama (como se houvesse viva alma que queira realmente tomar conhecimento desta ocorrência). Não saio. Não ando. Simplesmente, hoje, não quero saber.

1 comentário:

Feliz disse...

Às vezes sabe bem estar na cama!E porque não?Se o dia a dia já é tão cinzento, com a cinza tapando a vizibilidade num cinzeiro transparente. E o cheiro a tabaco queimado... O odor desagradável e o cansaço das correrias ofegantes!É isto que o nosso dia a dia me faz lembrar. E porque não querer descansar...vegetar...estar simplesmente deitado, nestes dias e noites tão gelados? Sabe bem sentir o aconchego e a calmaria em dias em que isso já não existe...