quinta-feira, setembro 20, 2007

Coração Polar

Coração Polar


Não sei bem de que cor são os navios
quando naufragam no meio dos teus braços
sei que há um corpo nunca encontrado algures no mar
e que esse corpo vivo é o teu corpo imaterial
a tua promessa nos mastros de todos os veleiros
a ilha perfumada das tuas pernas
o teu ventre de conchas e corais
a gruta onde me esperas
com teus lábios de espuma e de salsugem
os teus náufragos
e a grande equação do vento e da viagem
onde o acaso floresce com seus espelhos
seus indícios de rosa e descoberta.
Não sei de cor essa linha
onde se cruza a lua e a mastreação
mas sei que em cada rua há uma esquina
uma abertura entre a rotina e a maravilha
há uma hora de fogo para o azul
a hora em que te encontro e não te encontro
há um ângulo ao contrário
uma geometria mágica onde tudo pode ser possível
há um mar imaginário aberto em cada página
não me venham dizer que nunca mais
as rotas nascem do desejo
e eu quero o cruzeiro do sul das tuas mãos
quero o teu nome escrito nas marés
nesta cidade onde no sítio mais absurdo
num sentido proibido ou num semáforo
todos os poentes me dizem quem tu és.


Manuel Alegre

Porque te encontro em todos os suspiros e pensamentos que preconizam a nossa existência durante o hoje e o amanhã...

Anelar

sexta-feira, setembro 07, 2007

Once Upon a Time... In Portugal




Aprender a deixar as pessoas partirem...
Acho que esta é das lições mais complicadas que a vida tem... Como sobreviver à ausência e ao vazio deixado por alguém?
Recordando-a? Guardando-a dentro de nós, nas ruas que passamos juntos, nos cafés que paramos para estar em silêncio, nos sorrisos e gargalhadas que explodiam como fogo de artificio?



Era uma vez um rapaz com cara de miúdo, com os olhos azuis como o céu e com o cabelo sujo de brincar na areia.
Era um rapaz do mundo e toda a gente gostava dele (até os porteiros da discoteca). Havia algo nele especial, quase mágico: era as palavras que utilizava. Ele dizia coisas fantásticas que tornavam as nuvens negras e carregadas em campos de trigo amarelo e, por isso, ele nunca chorava, nem nas despedidas...
A sua barriga era farta de coisas boas e cada alimento que comia, tal como cada pessoa que conhecia, era especial: o sabor forte e picando do chouriço, o travo adocicado nas natas na massa de atum, a leveza com que enfrentava o copo da super bock.




As malas estavam quase prontas para a despedida: estavam tão cheias e carregadas com palavras, com músicas, com livros, com cartas (daquelas que nunca se perdem) que as lágrimas não tinham espaço ou peso para enrolarem na areia como o mar.
No final só se ouviam os gritos dos bêbedos no puzzle escuro da noite e o “Até amanha, quando acordares vai ter lá a casa...”

Fura Bolos