"As coisas tornaram-se mais difíceis para os homens quando descobriram que eu (ADN - posterior ser), para viver, também preciso de mitocôndrias. Isso já se sabia, mas o que não se sabia é que as mitocôndrias são um ser distinto daquele que eu formo, com os seus próprios genes e uma reprodução diferente. São uma espécie de parasita assexuado mas, um parasita necessário que se infiltra nas células que eu formo e vive em simbiose com elas.
Agora, aqui vai a má notícia para os homens: quem transmite as mitocôndrias é, em exclusivo, o corpo da mulher. Elas infiltram-se nos óvulos e é apenas deste que transitam para o novo ser e para todas as células.
Este pormenor foi muito útil aos investigadores para tentarem descobrir quem são e de onde vieram as ancestrais progenitoras humanas. Mas também se ficou a saber que só elas, e nunca os homens, poderão dar origem, por si sós, a um corpo com a capacidade de sobreviver.
Ou seja: quando os jogos sexuais forem definitivamente proibidos e não restar senão a clonagem para a sobrevivência da espécie, só as mulheres poderão deixar descendentes. Um clone masculino, por si só, para além de necessitar de um útero para gerar um novo corpo também necessita das mitocôndrias que estão no óvulo feminino.
Ninguém sabe por que foi que este parasita assexuado escolheu a via matrilinear para se reproduzir. E o mais engraçado é que as mitocôndrias são a máquina energética de todas as células e de todos os corpos. Pois bem: a fonte de energia dos homens vem exclusivamente das suas mães. Isso já se adivinhava, mas a história das mitocôndrias, preto no branco, foi mais uma machadada para o futuro do cromossoma coxo. A breve prazo o XY pode bem ser descartável."
(in J.L. Pio Abreu.(2007) Quem nos faz como somos)