segunda-feira, agosto 30, 2010

Fábulas

Eram duas da manhã e rebolavam naquele quarto escuro, à procura dos corpos que não conseguiam encontrar. Haviam prometido um ao outro amar-se para toda a eternidade, mas a eternidade é um pedaço de nada, e como tal um vazio que sempre o será.

O desejo de encontrar um amor genuíno e incorruptível era o mais importante, mais ainda do que o outro era na verdade, do que tinha este para oferecer. O pacto comum com o sentimento imortal era, de facto, o que interessava naquele momento.

Foi por isso que, embora deitados na mesma cama, não conseguiam tocar-se no rosto dos lençóis, que cegavam a cada suspiro. Antes de chegarem a esta intermitência, havia sido já percorrido um longo caminho, o qual atravessaram sem sequer se aperceberem, de tão ofuscados que estavam com promessas avulsas de amor eterno.

No culminar de cada relação falhada, cada um deles havia prometido a si próprio que haveria de ser feliz, mas…feliz de uma felicidade imaculada, que reparasse todos os danos anteriores e todos os que ainda viriam.

Quando se encontraram, gerou-se um cadinho de perfeição. Amar-se-iam até que a noite deixasse de o ser, e se transformasse em aurora para sempre. Amar-se-iam até que transformassem o outro no seu continente, no seu lar. Amar-se-iam até se perderem no brilho do olhar emanado pelo verdadeiro coração apaixonado.

Mas o tempo deixou de ser tempo, e o espaço transfigurou-se por casualidades e desajustes. Deixaram-se enrolar pela maré de acontecimentos, e não construíram um dique suficientemente forte para contê-la. A promessa de amor eterno assegurava, pensavam eles, que nunca deixariam de se amar, independentemente de todos os esquecimentos, todas as inconsciência e descuidos, intransigências ou distâncias que os pudessem apartar.

Enganaram-se. A promessa de amor eterno não chega. Não é uma varinha mágica que congela corações, e que os faz deixar de sentir qualquer tipo de raiva ou tristeza. E certamente não é antídoto para aquilo que se vai esquecendo de mudar, ou não se quer mudar com o pretexto do esquecimento.

É por isto que, quase uma hora depois, ambos adormeceram, ainda sem se encontrar.