segunda-feira, junho 30, 2008

Atlas Sound

I walked outside

I could not cry

I don't know why


É assim a letra do tema “Recent Bedroom” do último e único álbum de Atlas Sound.

Este álbum, editado este ano, chama-se “Let the blind lead those who can see but cannot feel” sendo que este é, na minha opinião, um nome, nada fácil de pronunciar radiofonicamente mas que reflecte muito do álbum.

Ao ouvir o álbum com atenção podemos fechar os olhos, tentando encontrar refúgio nos sons chuvosos e silenciosos de Bradford James Cox. Estes sons, algo melancólicos, algo metálicos transportam-me para janelas de comboios regionais em dias de chuva. O reflexo do nosso nariz de perfil no vidro molhado, um pouco distorcido, parece-me combinar bem com o som do comboio que arranha os carris da viagem cega. Num misto de segurança e dor é assim que a musica de Atlas Sound dança desengonçadamente no estômago, chorando sem lágrimas, num grito mudo.

"Let the Blind Lead Those Who See But Cannot Feel" retrata uma fase da vida de Bradford Cox quando este foi internado num hospital durante todo um Verão da sua adolescência, devido a uma doença de ossos degenerativa. O isolamento das paredes brancas do hospital sente-se neste álbum, que compôs sozinho com poucos instrumentos e o seu laptop.

Com influencias como Robert Wyatt, Everly Brothers, Suicide, Laurie Anderson, The Breeders, Robin Guthrie, Casino Versus Japan, Stereolab, William Voight, Sparks, S.E. Rogie, Nuno Cannavaro, Piere Henry, Raymond Scott, Roy Orbison, este é um album a não perder.


Neste marasmo de ideias quase sem sentido destaco duas musicas: Recent Bedroom e River Card.

MySpace

segunda-feira, junho 23, 2008

Viagens da Almerinda das Arroteias



Numa noite na varanda de casa foi decidido por unanimidade escrever ou relembrar ou simplesmente imaginar aqueles conselhos ou frases (quase em forma de mandamentos)que as avozinhas tanto nos dizem.
Estes conselhos, de tão sábios que são, fazem quase uma súmula de toda uma vida de experiências vindas algo do fantástico ou do (porque não?) bucólico (ou será burlesco?)?



1. Minha filha(o), guarda sempre o melhor para ti...
2. Agora os homes também já usam brincos? Nunca faças isso!
3. Um sorriso não custa nada a ninguém.
4. Vê la, você também tem telhados de vidro, também As tem em casa.
5. Ajudai o vosso pai, ele faz muito por vós.
6. Vê lá, andas sempre a mudar de namorado(a): quem muito escolhe, muito se engana.
7. Também já tomas dessas drogas???
8. Ele deve andar metido na farinha, que ele é só carros novos!
8. Ela nunca me enganou.
9. Olhaa...ela(e) juntou-se (sussurro).
10. Olha que uma mulher/homem quer-se refeitinha(o), estás muito magra(o)!
11. Não andes para aí a dar pão aos pitos!
12. Olha que ele toda a vida foi um escravo, labutou labutou e agora oh? Acho que ainda deixou um dinheirinho pós filhos.
13. Tu estuda, se algum dia quiseres ser alguém!
14. Olha que como fizeres a cama, assim te deitas.
15. Faz o teu pézinho de meia, nunca sabes quando te vai fazer falta.
16. Que é que ela anda sempre a fazer em redor, sempre em redor, sempre em redor do... padre?
16. Também usas dois brincos na orelha?
17. Um triguinho com planta e leitinho com a cevada é que te faz bem.
18. Olha, ele é Doutor mas anda a ajudar o pai no quintal!
19. ...as internets!
20. Areeerica amiga, não sejas como o Zé do Rato, tudo que tem, tudo põe ao trato.
21. Anda cá, que eu vou-te fazer uma espera!
22. Aquela entrada daquela casa é uma estrumeira, que gente porca! É preciso ter gosto!
23. Ele comprou um carro? Não! Anda a pagá-lo!
24. Olha eles são uma xupistas, andam sempre corridos pa lá, pa segurança social, eles uns xupistas!
25. Também andas com as calças rasgadas, falta-te dinheirinho em casa, é? Sempre remendado, sempre remendado!
26. Tu vê lá, ainda te calha uma boa Bisca!
27. Aquela mulher é limpa, tem sempre uma roupa no estendal sempre tão branquinha! Assim é que tu devias arranjar!
28. Olha que elas põem-se a pé cedo, não são como vós. Elas são videiras!
29. Férias? ai que a vida não está prá isso!
30. A empresa do oitro lá fechou, mas olha o dono ainda bufa bem, aí com bons carros! Eles não têm pena dos coitados!

Especial funerais:
1. Olha foi pa junto de Deus!
2. Quem ficaria com o cordão da avó?
3. Coitadinho, olha como Deus o apanhou de repente!
4. Quem será a assear a campa?
5. Ainda ontem andava aí todo direitinho...

Especial casamentos:
1. Gostou? O quê?? Só um xiquinho nos pratos, agora tudo quer ir pás quintas, tudo quer ir pás quintas e depois não há quem pague!
2. E a noiva estava bonita? uii cheia de brilhantes, com aquelas mamas ao leu!
3. Foi um casamento pla igreja ou plo civil?
4. Você pensa que não é com o dinheiro das prendas? como é que eles tinham dinheiro para isso?





Por favor, completem esta nossa colecção com mais grandes pérolas destas que se lembrem...

lol

sexta-feira, junho 06, 2008

Coliseu

Rubros de paixão, rubro de raiva, rubros de loucura, rubros de cansaço…Arroxeados com as soçobras de prazer que anteveram os primódios do amanhã…Desapareceu o sentimento..Apertou-se nele mesmo, deu um nó e sufocou-se..Que fazer com o corpo?Porque não escondê-lo entre as nossas entranhas, revolvê-lo e amordaça-lo, no recanto mais humano das vísceras…Deixa-lo contorcer-se de dor e de ódio..E num prelúdio do tempo, que já passou, ouve-se o derradeiro gemido agridoce que nos embala nas agonias trausentes que se vão perdendo em nós mesmos…As feras uivam lá fora, sedentas do sangue e da carne, dos restos..do sentimento…

domingo, junho 01, 2008

O beijo...







René Magritte










Gustav Klimt


















Pablo Picasso
















Meu coração tardou

Meu coração tardou. Meu coração
Talvez se houvesse amor nunca tardasse;
Mas, visto que, se o houve, houve em vão,
Tanto faz que o amor houvesse ou não.
Tardou. Antes, de inútil, acabasse.

Meu coração postiço e contrafeito
Finge-se meu. Se o amor o houvesse tido,
Talvez, num rasgo natural de eleito,
Seu próprio ser do nada houvesse feito,
E a sua própria essência conseguido.

Mas não. Nunca nem eu nem coração
Fomos mais que um vestígio de passagem
Entre um anseio vão e um sonho vão.
Parceiros em prestidigitação,
Caímos ambos pelo alçapão.
Foi esta a nossa vida e a nossa viagem.

Fernando Pessoa